segunda-feira, 23 de julho de 2012

Bolo de chocolate



Lá estava ela, perdida nos últimos barulhos da noite. Sentada nas estruturas metálicas daquele ponto de ônibus, nem mesmo os ruídos dos carros e a dança das folhas secas ao ritmo dos primeiros ventos de outono conseguiam amenizar sua impaciência. Sua aparência naquele momento se assimilava a de um cachorro assustado, cada singelo barulho fazia com que seus braços contraíssem a pequena bolsa preta àquele corpo frágil. Pela primeira vez em sua vida, estava absolutamente sozinha e afirmar tal condição para si mesma era tão macabro que a única sensação que conseguia sentir era medo; medo de não conseguir, de se envolver demais, medo de se perder...
Interrompendo de forma brusca seus devaneios seu objeto de espera chegará, e com um sorriso atrapalhado entrou e acomodou-se em uma das inúmeras cadeiras vazias; ironicamente estava sozinha em um lugar de multidões. Encostou a cabeça nos vidros sujos daquele ônibus, só tinha olhos para as luzes das ruas e prédios que se perdiam pela noite. Esta paisagem só catalisava  sua sensação de vazio; a ausência de alguém para quem pudesse dirigir a palavra, sorrir, abraçar... Não era mais só parte de um temor e sim uma realidade.
E sua expressão de amargor foi transformada por um cheiro; doce, suave, catártico. Lembrava-se de sua infância, os risos e o acolhimento, aquele odor lhe remetia a casa de sua avó e as tardes comendo bolo de chocolate. Deixou-se ser envolvida por aquele aroma e por alguns segundos sentiu-se como a pequena vendedora de fósforos, acolhida pelos braços de sua avó, e a cidade não parecia mais um tumulto cinza e sim uma enorme casa de avó. Sorriu delicadamente por fim e seguiu seu destino.

In memoriam Leillah Arias Zeller, de quem sinto falta todos os dias...

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